segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Realidade atual do morador de rua em Pelotas

Em dezembro passado, alunos de Jornalismo da UFPel realizaram um ensaio audiovisual sobre moradores de rua. Visitaram o Albergue e a Casa de Passagem, entrevistaram-se com a autoridade municipal, acompanharam a abordagem noturna e pediram opiniões a pessoas no centro da cidade. Só faltou o lado científico, para esclarecer algum aspecto social, psicológico ou ético. Após a edição, postaram na internet o trabalho, chamado "Sexta Opinião".

O programa se mostra como uma reportagem de TV com elementos de cinema, e apresenta sem maiores pudores uma realidade dura e os mais diversos pontos de vista relacionados com o problema (entende-se que o objetivo era mais a pesquisa de denúncia). Por seu lado, a edição não deixa de assinalar incoerências dos entrevistados e pontos dramáticos dos testemunhos. Dois desfechos (o desejo final do entrevistado, e o livro que um morador lia) deram o toque humano certo (veja aqui a segunda parte).

No entanto, a mistura de tipos de mídia e formatos (elementos de TV, cinematográficos, da internet), o uso de uma alegre música em inglês, There's got to be a way), além de um excessivo destaque dado aos autores do vídeo dissolve o lado trágico e doloroso da realidade mostrada, associando-o a algo mais espetacular, romântico ou mesmo simpático. É preciso discutir, também, pelo menos duas questões éticas neste trabalho:

  • a incoerência entre os modos de tratar os entrevistados (tu, você, o senhor): os pronomes de tratamento são os mais indicados para denotar respeito à dignidade do outro, seja uma autoridade ou alguém em extrema pobreza;

  • a exposição pública de pessoas em situação vulnerável: mesmo que apareça somente a voz do entrevistado, em imagem escura (o que foi positivo para ocultar sua identidade), requer-se da autorização do afetado, exceto quando for uma criança, ou um assim chamado "deficiente mental" (nestes casos, requer-se de um parente adulto responsável).


domingo, 30 de janeiro de 2011

Análise da rejeição social ao morador de rua

No artigo Quem vocês pensam que (elas) são? - Representações sobre as pessoas em situação de rua (Psicologia & Sociedade, vol.16 nº 2, Porto Alegre 2004), Ricardo Mattos e Ricardo Ferreira discutem 5 rótulos negativos tipicamente atribuídos ao morador de rua: vagabundo (sem trabalho), sujo (com doenças físicas), louco (com doenças mentais), perigoso (agressivo ou criminoso) e "coitadinho" (necessitado de compaixão e assistência).

Segundo os autores, tal ideologia de rejeição legitima a violência física contra estas pessoas e serve de referência para que elas constituam suas identidades pessoais. A partir dessa imagem indigna e desumana, o morador de rua sofre o desprezo, o medo e o desejo de eliminação, por parte do resto da sociedade - a que tem domicílio fixo.

A denúncia vai diretamente contra 5 tipos de discurso rotulador que destroem a dignidade da pessoa em situação de rua: o psicologista, o higienista, o psiquiátrico, o criminológico e o religioso (na mesma ordem dos rótulos). Entende-se que esses discursos são a ideologia de base que origina a rejeição às pessoas de rua, mas o texto não mostra claramente um discurso melhor.

Sem sair da denúncia, o artigo analisa três possíveis formas com que estas pessoas elaboram este "universo simbólico perverso que as acomete": a loucura (como fuga da realidade), o suicídio (como consumação material da morte simbólica) e a resistência, a partir da transformação social (opondo-se a esta ideologia de rejeição, através da luta pelos seus direitos). As duas primeiras assimilam a agressão externa, e a terceira seria a única opção positiva (defensiva e autoafirmativa).

Nas entrelinhas de alguns testemunhos de moradores de rua de São Paulo, os autores querem sugerir formas de abrir-se a esta população como seres humanos iguais a todos, necessitados de libertação e autonomia. No entanto, o texto se mantém num discurso de guerra, persecutório e dualista (opressores e oprimidos; resignação ou rebeldia), sem vislumbrar que o sofrimento está instalado no ser humano, pesquisador ou pesquisado, domiciliado ou não, "incluído" ou não.
Foto de Rubens Flores, em Itajaí (SC), Balaio de Siri

sábado, 29 de janeiro de 2011

Primeiros anúncios do Pop-Rua em Pelotas

Já contratados 4 profissionais para o novo projeto que estará ligado ao CREAS Pelotas, a secretária municipal de Cidadania e Assistência Social — Carmem Elisabeth Marques Dias (foto) — anunciou à comunidade o "CREAS Pop", serviço socioassistencial destinado a população de rua. Neste blog vamos chamá-lo por enquanto "Pop-Rua", tanto o serviço como a estrutura administrativa.

A notícia foi dada pelo site da Prefeitura na terça 25 de janeiro, com este título: Cidadania: um novo local para acolher a população de rua (clique para ler o texto completo).

Em seus últimos dias como titular da pasta (transmite o cargo na terça 1 de fevereiro), Elisabeth explicou que o serviço se destinava "exclusivamente à população adulta que vive em situação de rua", atendimento que ainda não existe em Pelotas, pelo menos durante o dia. À noite, a Casa de Passagem ainda é a única opção de acolhimento.

Ainda segundo a secretária, a equipe técnica teria duas assistentes sociais, um psicólogo e um agente administrativo, contratados por concurso público, todos com a função de recuperar a cidadania e os direitos sociais dos moradores de rua (alimentação, higiene, espaço para guarda de pertences pessoais, encaminhamento aos demais setores de saúde, socioeducação, fortalecimento de vínculos interpessoais e/ou familiares e construção de novos projetos de vida).

Três dias depois, o Diário Popular recolheu a novidade com a manchete: Creas Pop já tem endereço (clique para ler a matéria). Em entrevista com a chefe da pasta, a repórter Tânia Cabistany informou detalhes de localização do centro especializado: uma casa na rua Doutor Cassiano (foto à esquerda), que atenderá, das 8h às 17h, adultos que vivem em situação de rua.

Reiterou-se que a Casa de Passagem (Rua Três de Maio, 1.074) complementaria o projeto, dando hospedagem noturna; essa opção, no entanto, tem várias condicionantes e limitações (que veremos futuramente).
Fotos: Betel (1) e F.A.Vidal (2)